Thursday, May 20, 2010

Jacob's Room (Virginia Woolf)

Eu demorei para ler Virginia Woolf, tantos sugeriram e eu adiava... esquecendo que Woolf foi inspiração para Clarice Lispector, agora eu sei quanto em comum as duas tem.

A história de Jacob's Room - O quarto de Jacó, em português - se passa às vésperas da Primeira Guerra Mundial e é cheia de detalhes físicos e geográficos. Jacob's room traz o relacionamento entre pais e filhos como tema, o relacionamento de Jacob com sua mãe molda sua odisséia da infância à vida adulta.

Lendo a Introdução do livro, entendi que Virginia usa muito simbolismo em suas histórias, há várias "figuras" que reaparecem em diferentes obras - "o cair de uma única folha", "o crânio" (em JR um é achado por Jacob na praia e trazido para casa), "a árvore caída". Virginia também menciona por diversas vezes "sapos" durante a obra, lendo a Introdução entendi que Woolf acreditava piamente que sapos eram insetos e não anfíbios.

Virginia usa vários recursos para que o leitor guarde na memória certas cenas durante a leitura, algumas vezes cortando diálogos pela metade, adicionado fatos não relacionados com o curso da história - a chamada digressão, também usado por Mário de Andrade. Fora as repetições, onomatopéias e por aí vai.

A história começa com Jacob Flanders ainda criança, mostra sua inocência no ambiente praieiro em que nasceu. Betty Flanders é uma mãe super-protetora mas desatenta, vive nas nuvens - a primeira impressão que tive é a de que ela era fútil, um tanto atrapalhada e inexperiente, como aquelas mulheres que casam super cedo e são obrigadas a amadurecer quando os filhos chegam, no caso dela o amadurecimento não chegou ainda, há um quê de infantilidade e inocência em suas ações - recusa a declaração de amor de Mr. Floyd - clérigo da paróquia local, professor de Latim de seus três filhos, oito anos mais novo que ela -  porque não gosta de homens ruivos.

O tempo na história passa rapidíssimo, poucos parágrafos depois, Jacob já está a caminho de Londres para cursar a faculdade, escolheu um quarto no último andar do prédio da Corte Neville da Faculdade Trinity de Cambridge, estrategicamente situado ao lado da Biblioteca Wren - e é esse quarto que dá nome a história.

Apaixonado por Literatura, Jacob trava diálogos e debates com seus amigos sobre os prazeres das linhas de Virgílio, Byron, Shakespeare, Spinoza, Dickens, Carlyle e até mesmo Jane Austen, sem esquecer seu respeito enorme por autores gregos (tanto que os últimos capítulos são dedicados à viagem de Jacob à Grécia, para pisar na mesma terra e ver as mesmas paisagens vistas pelos grandes pensadores!). Fora de seu pequeno círculo social, Jacob é introvertido, de poucas palavras. Sem mesmo saber-se o porque, aqueles a quem é apresentado gostam dele logo de cara, há algo curioso em Jacob que atrai e agrada os que o cercam.
"(...) presume-se que ele seja de um jeito ou de outro - para ela, pelo menos - agradável, bonito, interessante, primoroso, de boa família, como seu próprio filho? É preciso fazer o melhor que se pode com tal relatório. De qualquer modo, esse era Jacob Flanders, dezenove anos." (pag. 24)

Após a mudança de Jacob para Londres, Virginia muda o foco para a vida social de Jacob e isso inclui sua vida sexual também. Essa é a primeira obra em que Virginia aborda o tema sexualidade tão abertamente. Jacob vê as mulheres como objeto, é bastante crítico e severo quanto as suas opiniões sobre o sexo feminino. É como se as mulheres fossem seres inferiores, se observarmos com que facilidade Jacob parte de uma mulher para a outra... começando com a mãe. Clara Durrant foi a primeira, não tiveram um relacionamento sexual mas o joguinho de olhares e visitas fez que com que Clara se apaixonasse e assim ficasse durante toda a história, iludida e esperançosa.

Florinda não tem família, não tem ninguém que a controle ou para quem retornar no fim do dia. Por ser órfã, Jacob não tem que se preocupar com a opinião dos pais (o caso de Clara), e o que faz a situação mais conveniente é que Florinda não têm vínculos que a encaixem num seio familiar, ou que a conduza ao desejo de construir uma família. Florinda é uma criatura atormentada mas cheia de apelo sexual, que guarda dentro de si um Jacob idealizado, por ele ela lê clássicos, visita museus, tenta ser culta. Jacob, por sua vez, sente-se tão perturbado por tamanha atração carnal que por vezes ameniza sua opinião sobre ela. A relação dos dois causa curiosidade porque eles são tão opostos, em todos os quesitos, especialmente o intelectual. O quarto de Jacob testemunha a conexão dos dois... até que Jacob vê Florinda nos braços de outro.
"Florinda - (...) seu vocabulário é abominável. Seus sentimentos infantis." (pag. 81)
Se Jacob é introvertido e calado, por outro lado sua mãe é uma tagarela. Quando ela não consegue trazer o filho para si, ela se faz presente através de cartas. De certa forma ela consegue colocar em Jacob alguns de seus valores familiares, e é após ler suas cartas que Jacob sente alguma ternura pelas mulheres com quem se relaciona.

Até aqui os desejos de todas essas mulheres são sujeitos às vontades de Jacob, seus desejos são por vezes incontroláveis e confusos, ambivalentes, questionáveis e problemáticos. Até aqui. Quando conhece Sandra Williams, na viagem pela Grécia. Nesse ponto a narrativa sucumbe à sua atração fatal, e Jacob se vê vítima de seu próprio comportamento, torna-se ele mesmo um objeto... o objeto de Sandra que faz dele um cachorrinho.

Por Sandra ele visita Constantinopla, escala o Pentelicus e vai a Acropolis, busca conhecer mais sobre a Grécia e seu povo. Sandra é casada e viaja com o marido. Ela é um personagem quase que cômico, sente uma certa atração por Jacob mas o fato de ter um homem mais novo apaixonada por ela massageia seu ego. Ela controla Jacob mantendo-o a uma certa distância, sabendo que ele é bonito mas perigoso (pag. 125) e ironicamente, o relacionamento deles lembra o leitor de um outro relacionamento de Jacob, que também se dá através de cartas... o da sua mãe.

E eu pensando que Virginia Woolf não era lá tão feminista...
"O problema é insolúvel. O corpo é preso ao um cérebro. Beleza anda de mãos dadas com estupidez". (pag. 68)

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