Monday, October 10, 2011

The Unbearable Lightness of Being (Milan Kundera)


''Os personagens dos meus romances são minha próprias possibilidades irrealizadas. É por isso que os amo e ao mesmo tempo tenho horror a eles. Eles cruzaram limites que eu mesmo tenho contornado. É esse cruzar de limites (o limite além de onde o meu próprio 'eu' termina) que tanto me atrai.'' (pag. 221)


Decidi escolher The Unbearable Lightness of Being - A Insuportável Leveza do Ser, em português - para o BookClub porque fazia um bom tempo que havia lido o livro, amei a história, mas ainda não havia comentado aqui no blog. Boa chance de refrescar a memória e re-ler um livro que amo.

O que falar sobre Milan Kundera? O que gosto em suas narrativas é que todos os personagens têm o mesmo peso na história, não há protagonistas, por isso não há o elemento surpresa - ele pode informar ao leitor que o personagem morreu no primeiro capítulo, a história continua, e o personagem continua a ser desenvolvido - sua intenção é conversar com o leitor sobre as relações humanas, suas ações e consequências, sobre o momento único do existir. E em The Unbearable Lightness of Being, que se passa no ano de 1968, Kundera explora a vida intelectual e artística da sociedade Tcheca durante o período Comunista.

Kundera faz uma reflexão filosófica contrária à Nietzche, que acreditava que as ações do universo são recorrências eternas, ou seja, já ocorreram e vão se repetir num círculo vicioso... infinitamente, o que causaria um ''peso'' em nossas vidas, podendo ser este peso positivo ou negativo, dependendo de como enxergamos tais ações... já Kundera traz a idéia de que só temos essa vida e que cada ação conta como única, o que acontece agora jamais acontecerá novamente - daí vem a idéia da ''leveza do ser''.

Muss es sein?  Es muss sein!  Es muss sein!
Terá que ser assim?  Assim deve de ser!  Assim deve de ser!
(pag. 32)

Essa idéia de leveza do ser é representada na história através de cada um dos personagens, mas eu destaco, obviamente, Sabrina e Tomás. Tomás é um mulherengo, após conhecer Tereza, ele reconhece que a ama, e sua vida não é completa sem ela. Ele sente uma ternura em relação a Tereza, sente responsabilidade de protegê-la, de trazê-la para baixo de suas asas, mas ao mesmo tempo, Tomás não consegue ser fiel a Tereza, ele precisa de outros corpos, sexo e amor são dois elementos que não estão necessariamente ligados. Tomás ama Tereza, mas precisa de sexo fora de Tereza.

Sabrina é como Tomás, com a exceção de que ela não tem a necessidade de nenhum tipo de ligação emocional para se sentir completa. Muito pelo contrário, Sabrina foge de qualquer tipo de apego, não cria raízes, e é por isso que ela e Tomás foram amantes por tantos anos, porque ambos buscavam um tipo de prazer e compreensão que os faziam amantes perfeitos. Não era apenas prazer sexual, era isso, e também uma certa cumplicidade, sem benevolência.

''(...) Ele havia agido contra seus princípios. Dez anos atrás, quando ele se divorciou de sua esposa, celebrou aquele evento do mesmo jeito que alguns celebram um casamento. Ele entendeu que não nasceu para viver lado a lado com nenhuma mulher e poderia ser completo sendo um solteirão. Ele tentou desenhar sua vida de tal maneira que nenhuma mulher se mudaria para seu apartamento com uma mala. Por esse mesmo motivo seu flat tinha apenas uma cama. Apesar do espaço enorme, Tomas sempre dizia a suas amantes que não conseguia dormir com ninguém ao seu lado, e as levava para casa após a meia-noite. (...) Mas dessa vez ele dormiu ao seu lado. Quando acordou na manhã seguinte, ele encontrou Tereza, ainda dormindo, segurando sua mão.'' (pag. 10)

Tereza descobriu logo no início do relacionamento que não era a única na vida de Tomás, mas nunca teve forças para abandoná-lo. Tereza é um personagem que incita compaixão. As meninas do BookClub a criticaram, eu consegui entender seu lado porque ela me fez lembrar a minha própria mãe. Tereza tinha esperanças de que um dia Tomás sentiria necessidade apenas dela. Tinha o desejo íntimo e gritante de ser amada, de ser querida nem que fosse por alguns instantes. Ela é um personagem extremamente carente, que preferiria mil vezes ter alguém infiel, mas ter alguém. Ter alguém a quem pudesse segurar as mãos fortemente, e saber que aquela pessoa estava ali enquanto ela dormia, do que acordar num quarto vazio. Tereza dormia segurando as mãos de Tomás como alguém se agarra à vida. E sofria calada.

''Era isso que o sonho queria dizer a Tomás, aquilo que Tereza mesmo não conseguia dizer. Ela veio para ele para escapar do mundo da mãe, um mundo em que todos os corpos eram iguais. Ela veio pra ele para fazer seu corpo único, insubstituível. Mas ele, também, havia desenhado uma placa mostrando que ela era igual as outras: ele as beijava do mesmo jeito, acariciavam-nas do mesmo jeito, não fazia absolutamente nenhuma distinção entre o corpo de Tereza e os outros. Ele a mandou de volta ao mundo que ela tentou escapar, enviou-na para marchar nua com as outras mulheres nuas.'' (pag. 58)

Tomás não era alheio ao sofrimento de Tereza. Kundera deixa claro ao leitor que Tomás tinha ciência do sofrimento que causava, mas também não tinha forças para deixar de fazer. E ao invés de desculpar-se, Tomás a presenteia com Karenin.

Quando a Revolução Tcheca começa, os personagens se dispersam, Sabrina e Tomás perdem contato, Tomás se ver obrigado a deixar seu emprego no hospital que tanto respeitava, e sua pátria, por não baixar sua cabeça e obedecer o novo regime. Mudam para Suiça, mas Tereza não está feliz. Tereza sabe que mesmo em um outro ambiente, Tomás não mudará. E é quando Tereza o abandona e volta para Praga que ele percebe o tamanho do espaço que ela ocupa em sua vida.

Tomás abandona o hospital na Suiça e volta para Praga em busca de Tereza e Karenin, perseguido pelo regime, passa de médico renomado a limpador de janelas, no fundo culpa Tereza por seu declínio, ela o fez voltar... mesmo não verbalizando sua vontade, foi por Tereza que ele voltou, voltou para sua ruína.

''A negação ao comprometimento. A fina linha que distingue o que é bom e o que é mau, é algo que estamos começando a perder. Não temos mais a menor idéia do que significa sentir culpa. Os Comunistas têm a desculpa que Stalin os enganou. Assassinos têm a desculpa de que suas mães não os amaram. Ninguém poderia ser mais inocente, em sua alma e consciência, do que Edipo. E ainda assim, ele puniu a si mesmo quando viu o que havia feito.'' (pag. 218)

Sabrina muda para Paris, conhece Franz. A princípio ela acredita que o relacionamento não passará de mais uma aventura para ambas as partes. Suas intenções continuam as mesmas. Sabrina sabia que ela e Franz não tinham nenhum outro tipo de afinidade. Franz nunca a entendeu, não era o mesmo relacionamento intelectual e sexual que tinha com Tomás, que mesmo em silêncio a compreendia. No momento em que Franz abandona sua esposa por Sabrina, ela, sem mesmo olhar para trás, parte para os Estados Unidos.

As opiniões sobre o livro foram variadas, Nari e Jessica comentaram que o fato de a história não seguir uma sequência cronológica, e as muitas doses de filosofia as desagradaram - o fato de que Kundera escreve sobre sexo tão deliberadamente também não as ajudou, e elas quase desistiram da leitura... Na minha opinião, esse é um dos motivos pelo qual eu gosto da história. Como mencionei acima, o objetivo de Kundera não é focar nos personagens em si, Tomás e Tereza; Sabrina e Tomás; Sabrina e Franz; Tomás, Tereza e Karinin; mas sim explorar suas ações. As ações dos personagens e suas escolhas, são os elementos principais da história.

''Ele subitamente lembrou do mito Symposium de Platão: As pessoas eram hermafroditas até que Deus as separou em dois, e agora todas as metades perambulam pelo mundo em busca de sua outra metade. Amor nada mais é que do que saudade da nossa outra metade perdida.'' (pag. 238)



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