Thursday, July 2, 2009

A thousand splendid suns (Khaled Hosseini)




"Mariam tinha cinco anos de idade quando ela ouviu pela primeira vez a palavra harami."

O destino de Mariam nunca foi muito promissor.
Filha bastarda de um rico empresário em Herat chamado Jalil que, apesar de ter suas 3 mulheres, engravida a servante Nana. Obrigada a deixar a casa onde trabalha, Nana é exilada numa kolba, construída pelo próprio Jalil, a alguma distância da cidade.

Mariam cresceu iludida com o amor do pai. Jalil a visitava uma vez por semana e era esperado com ansiedade e animação pela filha. Sempre a tratava com carinho, contava histórias da cidade e dos filmes em exibição no cinema que era proprietário e desmentia as alegações de Nana.

Nana era o oposto de Jalil, cheia de ressentimentos e amargura pela sua situação, sempre explodia seus comentários e desilusões em Mariam.


"Você é uma harami desajeitada. Esse é o meu prêmio por tudo que
tenho suportado. Uma quebradora de bens de família, harami desajeitada."

Quando completa 15 anos, Mariam pede de presente do pai sua ida ao cinema com o pai e seus irmãos e irmãs. Apesar de tentar argumentar, Jalil concorda e quando no dia marcado não aparece, Mariam decide procurá-lo. A mãe diz que morrerá se Mariam partir. É a primeira vez que Mariam deixa a kolba. É a primeira vez que Mariam vê a cidade de Herat. É quando descobre o significado da palavra harami.

Ao achar a casa do pai, o servante lhe comunica que Jalil não está em casa. Mariam passa a noite sentada na varanda a espera do pai - no frio, com fome e sede. Pela manhã quando o motorista a encaminha para o carro, Mariam percebe um rosto na janela do segundo andar, antes que ela identifique, desaparece. Aquele olhar, aquela barba... Mariam perde total amor por Jalil. Ao voltar a kolba, o motorista desesperado tenta cobrir seus olhos... o corpo de Nana embaixo da mesma árvore em que sentou vendo Mariam partir, pendurado em uma corda.

Mariam não pode viver com o pai e em poucos dias uma das esposas de Jalil comunica a Mariam que ela casará com um sapateiro de Kabul chamado Rasheed. Uma ótima maneira de se livrar de vez da vergonha de ter a filha bastarda do marido por perto.

Após o choque dos primeiros dias, Mariam começa a se adaptar a nova vida. Rasheed a trata com carinho, atenção, a leva para visitar a cidade, compra presentes. Mariam sente-se protegida e amada, afinal Rasheed é agora tudo o que tem. Em poucos dias é apresentada a burqa.

"E a burqa, ela aprendeu para sua própria surpresa, era também
confortante. Era como um espelho de duas faces. Olhando de dentro, ela era uma observadora, protegida dos olhos examinadores de estranhos. Não mais se preocupava se as pessoas sabiam, com um simples olhar, todos os vergonhosos segredos do seu
passado."
(pag. 66)


Rasheed quer um filho. Faz uma festa quando Mariam engravida, tem certeza que é um menino a quem chamará de Zalmai. Quando Mariam perde a criança, a atitude de Rasheed muda completamente. Após as várias outras tentativas resultando em abortos espontâneos, Mariam perde as esperanças de ser mãe, agora é espancada, humilhada e tratada como uma empregada.

Em 1992, Laila entra na vida de Mariam.

Laila era a filha mais nova de Mamy e Babi. Babi era professor universitário antes de Kabul ser invadida e agora trabalha numa panificadora, casou com a prima Mamy. Tinham 3 filhos, Ahmad e Noor, os mais velhos haviam se alistado ao Mujahideen para lutar pela liberdade do Afeganistão, e Laila, a querida de Babi, inteligente, uma das melhores estudantes da classe, Babi via em Laila um futuro brilhante.

"Eu sei que você ainda é jovem, mas quero que você entenda e aprenda isso agora. Casamento pode esperar, educação não. Você é uma garota muito, muito brilhante. De verdade. Você pode ser qualquer coisa que queira, Laila. Eu reconheço isso em você. E eu também sei que, quando essa guerra acabar, feganistão vai precisar de você tanto quanto de homens, talvez até mais. Porque uma sociedade não tem nenhuma chance de sucesso se suas mulheres forem ignorantes, Laila. Nenhuma chance." (pag. 103)


Laila tinha um grande amigo de infância chamado Tariq. Tariq havia perdido uma perna ao pisar numa mina quando visitava o tio em Ghazni mas mesmo assim defendia Laila dos meninos encrenqueiros na rua. A família de Tariq tratava Laila como filha e com a depressão da mãe, sentia-se mais em casa ali do que na sua própria casa.

Desde a partida de Ahmad e Noor, Mamy entra em depressão, quase não deixa o quarto, dorme grande parte do dia, esquece de buscar Laila no colégio. Quando a notícia chega de que Ahmad e Noor morreram em combate, Mamy culpa Babi... um covarde que deixa os filhos irem para a guerra enquanto ele permanece em casa.

A pressão da guerra aumenta, bombas e mísseis voam pelo céu de Kabul. Babi vê-se obrigado manter Laila em casa, ir a escola é um perigo. Laila começa a perder seus amigos para a guerra, Hasina é atingida por uma bomba ao voltar da escola. Babi sugere a Mamy que deixem Kabul antes que seja tarde, Mamy jamais deixará a cidade, sonha em ver o Afeganistão livre para honrar os filhos. Giti, outra grande amiga de Laila, havia deixado Kabul para um casamento arranjado. Tariq visita Laila para informar que estão deixando Kabul rumo ao Paquistão, Tariq a pede em casamento - assim terão chances de sobreviver. Laila era a única coisa que ainda importava na vida do pai, jamais o deixaria. Entre lágrimas, Tariq e Laila fazem amor. Sem dizer adeus, Laila fecha a porta, Tariq promete do lado de fora que voltará, que voltará para buscá-la.

Quando Mamy concorda em partir, a guerra já havia destruído quase toda a vizinhança. Babi sonha em ir para os Estados Unidos, a camisa que usava tinha a foto da Golden Gate Bridge, em San Francisco. Laila vê Mamy na janela do segundo andar, arrumando suas malas enquando ela mesma carrega os livros de Babi que serão vendidos para juntar dinheiro para partida. Quando o míssel atinge a casa, a última coisa que Laila vê ao atingir o chão é um pedaço de uma camisa com a foto de uma ponte.

É aqui que Laila entra na vida de Mariam, Rasheed socorre Laila e Mariam cuida até que esteja recuperada. Após um mês em recuperação, Laila recebe a visita de Abdul Sharif, após uma longa história Abdul diz que conheceu Tariq no hospital onde o mesmo lhe contou sua história - ônibus em que estava com a família havia sido bombardeado a caminho do Paquistão - Tariq havia sido único sobrevivente mas na manhã seguinte, não resistindo aos ferimentos, havia falecido.

Laila percebe as atenções de Rasheed e quando Mariam lhe informa que o marido deseja casar com ela, Laila aceita sem hesitar - há alguns dias havia percebido sua barriga crescer. Laila estava grávida, de Tariq.

Rasheed trata Laila com mais atenção do que tinha tratado Mariam nos primeiros meses. Mariam, por sua vez via Laila como rival, alguém que chegou para ocupar o seu lugar... agora que estava velha e marcada pelo tempo e a violência de Rasheed. Mariam e Laila tiveram brigas terríveis. A atitude de Rasheed muda completamente quando Laila dá a luz a uma menina, Aziza e suas dúvidas quanto a paternidade crescem porque Laila se recusa a ter relações com ele.

Mariam despreza a criança a princípio, sente uma certa inveja de Laila por nunca ter conseguido levar adiante uma gravidez. Em uma noite em que Rasheed enfurecido espanca Mariam, Laila tenta protegê-la, enfrentando Rasheed. Mariam finalmente tem alguém no mundo com quem pode contar.

Mariam encontra em Laila e Aziza o carinho e amor que sempre desejou ter. Tentam fugir com o dinheiro que Laila vem roubando de Rasheed há meses. São descobertas, espancadas e trancadas no escuro, sem comer ou beber por quase 1 semana.

Em 1997, Talibã começa a governar o Afeganistão, o que pensavam ser um recomeço, resultou no que conhecemos hoje (através da mídia e também do outro livro de Hosseini, O caçador de pipas). Rasheed, que desde que casou com Mariam manifestava apoio ao regime do Talibã, estava totalmente satisfeito com as novas regras.

Música, livros e televisão foram banidos do Afeganistão, até mesmo os pássaros foram proibidos de cantar e eram mortos. A repressão afetava mais diretamente as mulheres, proibidas de deixarem suas casas sem um familiar masculino, proibidas de mostrar a face, proibidas de usar maquiagem, roupas chamativas, falar, fazer contato visual, sorrir e pintar as unhas, bem como frequentar escolas e trabalhar.

É possível testemunhar o sofrimento das mulheres afegãs quando Laila, grávida do segundo filho, precisou dar a luz, após visitarem 3 hospitais foram informadas que apenas homens eram tratados ali. Apenas 1 hospital em Kabul trataria mulheres e este, transbordava de mulheres a procura de socorro médico. Após horas de espera, Laila foi atendida e a esse ponto precisava de cesariana. Sem medicamentos de qualquer tipo, Laila teve sua cesariana ali, sem nem mesmo anestesia.

Zalmai era adorado pelo pai, e como homem foi crescendo e criado com o conceito de que as mulheres são inferiores. A miséria tomava conta de Kabul, Rasheed perde sua sapataria para um incêndio, sem emprego e com as economias acabando, Mariam, Laila e Aziza passam fome porque o pouco que têm é de prioridade de Zalmai e Rasheed.

Rasheed consegue empregos aqui e ali mas sempre acaba sendo demitido, primeiro porque não consegue controlar seu temperamento, segundo porque é pego dormindo em serviço. Em pouco tempo nem mesmo ele e Zalmai escapam da escassez. É quando Mariam tem a idéia de procurar o pai, Jalil. Ao conseguir contato, descobre que o pai faleceu em 1987. Mariam lembra que em 1987, recebeu a visita de Jalil, jamais abriu a porta. Por horas Jalil esperou por uma resposta, viu rapidamente um rosto no segundo andar. Aqueles olhos, aquele rosto... Deixou para Mariam uma carta, que fora rasgada antes mesmo de ser aberta. Já doente, veio para se despedir.

Rasheed sugere que Laila entregue Aziza para um orfanato, a separação foi dura mas sempre que podia, Laila visitava a filha. Rasheed começa a trabalhar como porteiro de um hotel. É nessa ausência que Laila recebe uma visita inesperada.
"Seus joelhos enfraqueceram. Laila desesperadamente queria, precisava, procurar pelos braços de Mariam, seus ombros, seu punho, alguma coisa, qualquer coisa, para se apoiar. Mas não o fez.
Não se atreveu. Não se atreveu a mover um músculo. Não se atreveu a respirar, nem mesmo a piscar, por medo de que não seja nada além de uma miragem (...) abriu e fechou seus olhos, ele ainda estava lá.
Tariq ainda estava lá." (pag. 291)
A história da explosão do ônibus foi plantada pro Rasheed para fazer de Laila sua esposa. Era como se os dois ainda fossem aqueles adolescentes, como se o tempo não tivesse passado. Zalmai furioso com a mãe por estar falando com aquele estranho destratava Miriam que tentava acalmá-lo. Tariq havia voltada como prometido. Também voltaria no dia seguinte. Partiriam.

Partiriam em segredo se não fosse por Zalmai contar para Rasheed tudo o que havia se passado naquela tarde. Furioso Rasheed pergunta onde Zalmai esteve enquanto o estranho visitava. Com os olhos cheios de lágrimas, Zalmai viu seu veneno voltar contra si. Trancado no quarto, Zalmai ouve os gritos de Laila e Mariam enquanto Rasheed as espancava.

Laila grita que Rasheed mentiu para ela.
"E VOCÊ NÃO MENTIU PRA MIM? Você acha que eu não percebi? Acha que eu não sei da sua harami? Pensa que eu sou bobo, sua vagabunda?" (pag. 300)
Com ódio e descontrolado, Rasheed aperta o pescoço de Laila, aos poucos ela vai perdendo as forças... Mariam não consegue tirá-lo de cima da amiga. Corre para o quintal, volta com a pá, grita por Rasheed. Acertou ele na têmpora. A pancada o derrubou de cima de Laila.

Laila parte para o Paquistão com Tariq, Aziza e Zalmai.
Mariam decide ficar, mesmo com todo o sofrimento que a vida lhe trouxe, o amor de Aziza e Laila a fizeram extremamente feliz, era tudo o que ela tinha. Por outro lado, ela matou Rasheed, tirando de Zalmai o direito de ter um pai, jamais conseguiria viver com essa culpa. Sim, decide ficar e se entregar às autoridades Talibãs. A única mulher na prisão acusada de homicídio, ganhou reverência e fama entre as mulheres por sua coragem. Após 10 dias na prisão, foi apedrejada no Estádio Ghazi.

A história não termina com o apedrejamento de Mariam, tem que ler o livro pra saber o final... mas Khaled Hosseini tem um modo todo especial para contar suas histórias. São personagens tão humanos, tão verdadeiros. Sofre-se com eles, fica-se ansioso com eles... No O caçador de pipas, mostrou-se o drama aos olhos de um menino, o lado masculino do Afeganistão, o que é bem diferente da realidade feminina. Lógico que uma guerra afeta a todos, mas no caso do Amim, afetou financeiramente e geograficamente. No caso da Mariam, só o fato de ter nascido mulher já conta como ponto negativo num país como Afeganistão onde, mesmo antes da guerra, as mulheres tinham um papel secundário na sociedade, adiciona-se os fatos de ter sido uma harami, ter casado com um tirano e ainda ter o Talibã...

É uma história ao mesmo tempo devastante e inspiradora, que mostra que o amor e amizade sobrevivem ao tempo, a miséria, ao ódio e as mais terríveis provações de uma guerra.
"Ninguém pode contar as luas que brilham nos seus tetos,
ou os mil esplêndidos sóis que se escondem atrás de suas paredes."
(Saib-e-Tabrizi, poema sobre Kabul, séc. XVII)

2 comments:

Juliana said...

Ah, nao acredito, eu tbm to lendo esse livro...Comprei na promoção da saraiva.


e bom mesmo??

Andréia M. G. said...

Simplesmente linda a sua descrição, assim como deve ser o livro. Li o "Caçador de pipas" e me emocionei a cada linha. "A cidade do sol" está na cabeceira de minha cama, aguardando tempo (que me tem faltado) para começar a leitura, que sei que será ininterrupta, pelo brilhantismo de Khaled Hosseini.