Saturday, March 26, 2011

Poema de Sábado

Poemas Inconjuntos

Não basta abrir a janela
Para ver os campos e o rio.
Não é bastante não ser cego
Para ver as árvores e as flores.
É preciso também não ter filosofia nenhuma.
Com filosofia não há árvores: há idéias apenas.
Há só cada um de nós, como uma cave.
Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora;
E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse,
Que nunca é o que se vê quando se abre a janela.

Fernando Pessoa - Poemas 
Completos de Alberto Caeiro

Thursday, March 24, 2011

The Book Borrower (Alice Mattison)

Decidi comprar esse livro pelo óbvio motivo: o título dizia que livros estavam envolvidos!
Como eu não leio o resumo da contra-capa, não tinha a menor idéia de que se tratava a história... e para minha surpresa, Toby Ruben, a book borrower (aquela que empresta algo - nesse caso, livros), apenas menciona emprestar 3 ou 4 livros durante a história toda.

O modo como a história foi escrita é interessante. A história de Toby Ruben é contada paralelamente à história de Jessie, que por sua vez é a protagonista da história do livro que Toby está lendo... livro este que foi escrito pela irmã de Jessie, Miriam. Meio que uma biografia não-autorizada da irmã, que fora, quando jovem, acusada de causar uma rebelião que resultou na morte de sua irmã mais nova, Sarah.

Jessie cresceu no seio de uma família de imigrantes judeus. O pai fazia parte da união de trabalhadores da companhia ferroviária. Jessie cresceu freqüentando as reuniões e ouvindo seu pai discursar. Mais tarde, o pai de desvencilha da união mas não sem antes plantar a semente em Jessie, que ainda adolescente, abandona a família e passa ser integrante ativa no partido dos trabalhadores, reivindicando melhores salários, organizando greves e manifestações.

A história paralela começa com a Toby inexperiente - acabara de ser mãe pela primeira vez, tentando balancear a rotina de mãe, esposa, dona-de-casa, os livros meio que viram um recurso para fugir da sua realidade, até que Toby conhece Deborah, e o leitor acompanha o desenvolvimento daquela amizade... e é Deborah quem empresta o livro da "Garota do Bonde", o livro que conta a história de Jessie.

"E ainda assim Gussie Lipkin insisti em sua inocência no crime em que fora acusada: homicídio. Ter matado sua própria irmã" (pag. 114)

Mais que o conflito interno da Jessi (que mais tarde virou Gussie Lipkin), a história compartilha com o leitor um pouco das experiências dessas três mulheres em meio a uma sociedade em transição. E em meio a todas essas mudanças externas, a amizade de duas mulheres transcende os anos, os altos e baixos, decepções e crises.

Não vou dizer que The Book Borrower me prendeu a atenção, também nem sei o que estava esperando ao ler o livro, o que posso dizer que gostei na leitura foram os fatos históricos, perceber as transições no decorrer da história, as mudanças comportamentais dos personagens conforme as mudanças sociais, o amadurecimento emocional. Mas a história em si, não sei, deixou-me com a sensação de que alguma coisa estava faltando. Talvez porque não consegui me identificar com nenhum dos personagens ou sentir uma certa familiaridade com os fatos, não consegui sentir a história como deveria... estarei eu perdendo minha sensibilidade literária?

"Me liga, Jessie. Eu acho que mataste a Sarah. Eu te perdôo apesar de tudo. Me liga" (pag. 264)

Monday, March 21, 2011

Ape House (Sara Gruen)




"Rose a observou, como se a analisando. E até que decidiu quebrar o silêncio. "Semana passada eles infectaram um filhote de chimpanzé com leucemia colocando o veneno na mamadeira dele. Outros são sujeitos a cuidar do gramado, lidar com produtos químicos, cosméticos - vai nomeando. Alguns são viciados em drogas, outros trancados em quartos sem ventilação externa em que eles enchem com fumaça de cigarro. Um dos chimpanzés teve todos os dentes arrancados para que alguém tivesse a oportunidade de praticar diferentes técnicas de implantes dentário nele." (pag. 130)


Eu tinha certeza que esse livro da Gruen seria bom. Water for Elefants foi um dos meus livros favoritos de 2010, não apenas por ter sido uma história rica, mas porque a riqueza da história foi baseada em meses e meses de estudo de campo. O que me encanta na Sara é essa técnica toda dela de criar suas histórias/ romances com relatos históricos.

Sara Gruen não nos decepciona nessa nova empreitada em Ape House, A Casa dos Primatas em português. Fiquei ainda mais impressionada e fã dessa escritora ao saber do tanto de pesquisa e estudo envolvidos na escrita de Ape House. Sara Gruen viajou para o Canadá para estudar um pouco de Linguística, e só após tal estudo, Sara foi permitida a interagir com os primatas... e essa experiência incrível foi relatada através de John, um dos protagonistas da história.

Ape House conta a história de Isabel Duncan, que trabalha como pesquisadora e cientista do Great Ape Language Lab em Kansas. Isabel vem desenvolvendo pesquisas sobre a linguagem e o comportamento dos primatas... e esse é um dos pontos super interessantes do livro - o modo como os primatas se comunicam com os humanos através da linguagem de sinais, como eles pensam, interagem e aprendem com os humanos e trocam conhecimento... e o quanto se assemelha ao nosso modo de agir.

A pesquisa de Isabel causa curiosidade em jornais e revistas especializadas, e é aqui que John Thigpen entra na história. John e a equipe do The Philadelphia Inquirer viajam para Kansas para entrevistar Isabel e interagir com os primatas... horas após a entrevista, o laboratório é bombardeado - tudo leva a entender que foi um incidente causado por um grupo de protestantes em defesa dos animais. Isabel é hospitalizada em estado grave, e os primatas desaparecem sem deixar rastro...

"Ela havia se apaixonado por um seqüestrador, torturador, e assassino. Ela se abriu para ele, fez amor com ele, estava se preparando para dividir o resto da sua vida com ele, e até mesmo pensou em filhos. Ele havia compartilhado com ela apenas o que ele queria que ela acreditasse sobre o seu trabalho, e ingenuamente, ela acreditou." (pag. 138)

Após semanas em recuperação, Isabel finalmente deixa o hospital e tenta descobrir o que aconteceu com os primatas... e é durante essa busca por resposta que o ladro negro da história vai se desenvolvendo. O que se esconde por trás das pesquisas de laboratório, dos testes feitos em animais, e muitos outros fatores que nem chegam aos olhos do público. E o que fazer para denunciar? Para não se deixar intimidar pela poderosa indústria?

Sara Gruen denuncia em Ape House, o modo cruel com que tratamos os animais, os atos mais desumanos e vergonhosos a que esses animais são submetidos em nome da "Ciência". Ler Ape House causa aperto no coração e revolta, vergonha de pertencer a uma raça que se diz racional, mas é capaz de atos tão absurdamente primitivos.

"Muito das cenas envolvendo os primatas nesse livro são também baseadas em fatos - como o incêndio no Zoológico da Philadelphia, o gorila (Binti Jua) que salvou a vida de uma criança, os tipos de experimentos feitos em chimpanzés e as condições a que são submetidos, os tratamentos e o abandono dos chimpanzés da Força Aérea Americana - embora eu tenha tomado a liberdade de escrever de forma fictícia os nomes, datas e lugares. Muitas das piores condições já foram denunciadas, mas eles demonstram o modo com que temos tratados nossos parentes mais próximos - como "tubos de ensaio cabeludos" é como o Dr. Fouts diz."

Resta saber se assim como Water for Elefants, Ape House vai virar filme... se Hollywood terá coragem de mostrar nas telas do cinema os fatos relatados na história de Sara, batendo de frente com uma indústria que Hollywood mesmo incentiva. Virando filme ou não, Ape House conta uma história magnífica, surpreendente, daquelas que não se quer parar de ler.


Saturday, March 19, 2011

Poema de Sábado

Faz tempo que não passo por aqui, tenho sido um tanto relapsa com meu blog. Mas hoje cá estou compartilhando com vocês meu poema de sábado.

Primavera

Surgiram as pétalas do sol!
Era um novo dia que despontava!
Havia tantos pássaros nos ares
Que se confundiam nas nuvens

Lá fora, uma procissão suave,
De cores confusas, vivas
Em algazarra medonha e acesa
Rumava para a casa das flores!

Entrei nesse desfile e extasiei-me...
Estavam todos alegres, cantando
Eram rosas, violetas, jasmins, tulipas
Cravos, lírios, margaridas,
Desfilando pelos campos verdejantes,
E num coro infinito e multicolor
Despertavam em delírio, a natureza!
É que chegara doce, linda, a primavera!

(Gaitano Antonaccio, Estafa de Amor)