Monday, August 24, 2009

Madame Bovary (Gustave Flaubert)


De tanto ouvi falar das controvérsias de Emma Bovary e a polêmica do real intuito de Flaubert ao escrever a história, decidi ler o livro e tirar minhas próprias conclusões.
Madame Bovary... por onde começo?
A história começa e termina com a vida de Charles Bovary. Charles foi, desde criança, average! Nunca foi o melhor, também não era o pior. Aquele sempre em cima do muro. Introvertido, na média, foi acostumado desde pequeno a ser mandado, a obedecer, a nunca tomar decisões por si, cresceu solto pelos campos do interior, enquanto as outras crianças estudavam, Charles perambulava.
O pai, Sr. Bovary, quase sempre bêbado, pouco se importava com educação, nunca se deu o trabalho de enviar o filho a escola, o que só acontece quando Charles completa 12 anos, e por causa dos arranjos da mãe, Sra. Bovary, a grande incentivadora, nunca desistiu do sonho de ver o filho ser alguém. O caráter de Charles é compreendido em seu primeiro dia de aula, atrapalhado e tímido, a professora pergunta seu nome: Charbovari.

Quando Charles entrou para a escola de Medicina (antes mesmo de terminar os estudos básicos) fica evidente sua ignorância, dos livros pouco compreendia, não importa o quão atento tivesse, não entendia patavinas das aulas assistidas. Levou a sério no início, até gazetar a aula prática no hospital, no próximo dia outra aula... Não mais voltou.

Com o esforço da mãe, Charles volta ao estudo e termina a faculdade para virar um médico medíocre de uma cidadezinha do interior. A mãe decide que o filho precisa casar. É ela quem encontra a esposa, a viúva de um oficial de justiça, feia e magra, de 45 anos e boa pensão.

Conhece Emma quando presta serviços ao pai Sr. Rouault de Les Bertaux, que havia quebrado a perna. Emma Rouault, uma adolescente do interior educada em colégio de freiras, a mãe falecera há 2 anos, governa a fazenda do pai, que Charles acreditava ter posses. Pouco conhece do mundo e do pouco que conhece, aprendeu lendo livros - romances, para ser mais precisa. Achava Charles inteligente, por ser médico e por ler. Charles, encantado pela beleza, doçura, inteligência e elegância de Emma, não consegue esconder seu interesse pela jovem, Sr. Rouault vendo em Charles um bom pretendente para a filha, tenta mantê-lo por perto.

A esposa de Charles, enciumada pelas frequentes visitas do marido a Les Bertaux mesmo após a recuperação do paciente, aumenta as reclamações em relação a sua saúde, morre algum tempo depois e em menos tempo ainda acontece o casamento de Emma e Charles.

O desencanto de Emma acontece nos primeiros meses de casada. Charles era completamente apaixonado e encantado pela esposa, admirava tudo em Emma, que por sua vez começou a criar uma aversão e antipatia pelo marido. Imaginava a vida de casada como um romance, cheio de aventuras e emoção, perguntava-se se não teria um meio, por chance do destino, de conhecer um outro homem e imaginava-se nesses eventos irreais, nessa vida diferente, com esse marido que não conhecia, como seria? Nenhum deles se parecia com o marido que tinha.


"Meu Deus, porque casei?" (...) Mas sua vida era tão fria
quanto um sótão exposto ao lado norte, e tediosa, aquela aranha silenciosa fazia teias em cada canto escuro do seu coração"
(Pag. 63).
Responsável pelas finanças do marido, Emma aproveita-se da posição para tentar aliviar seu tédio e rotina, muda o estilo do cabelo por diversas vezes, faz assinatura de revistas de moda francesas, compra vestidos da moda, chales, lenços, livros e livros (romances), decide aprender italiano, compra dicionários, gramáticas. Tenta ler livros mais sérios, História e Psicologia. Redecora a casa, o guarda-roupa de novo. Toda bem vestida, as vezes passava a dia inteiro sentada no sofá... fazendo nada. Quando Charles é convidado para um jantar na casa do Visconde, Emma sente, pela primeira vez, o gostinho da corte francesa. O luxo, a pompa, a elegância dos vestidos e da maneira das mulheres ali presentes... sente inveja daquela vida, é isso o que quer pra si. Lembra daquela noite por dias e dias, desejando reviver aquele momento, mas logo sua vida volta ao tédio de sempre. Anos se passam e Emma não dá a Charles um herdeiro.

Charles considera Emma uma esposa perfeita, sempre elegantemente vestida, cheirosa, a casa e o jantar bem servido... quando nota a mudança de atitude de Emma, acredita que a esposa esteja doente, chora, escreve e pede pela companhia da mãe. Sra. Bovary o aconselha a ser pulso-firme, acredita que os livros contaminam os pensamentos de Emma.


"Lendo novelas, livros demoníacos, livros contra
religião em que eles fazem graça de pastores e citam Voltaire (...) Uma pessoa sem religião sempre acaba mal."
(pag. 133)

Decidem mudar de cidade, novos ares (segundo Charles) farão bem para a saúde da esposa. Charles aceita emprego em Yonville, Sr. Homais, o farmacêutico da cidade corre risco de ter sua licença cassada por estar atuando como médico sem permissão. Emma está grávida.

Homais é tudo o que Charles não é, corajoso, inteligente e sempre em busca de novos conhecimentos, ler compulsivamente e escreve uma coluna para o jornal Rouen Beacon. Está sempre atualizado com as novidades científicas. Imagino Homais como um homem hiperativo, daqueles que não consegue para quieto e se parar, sua mente está a milhões por hora.

Emma conhece Léon, estudante de Direito, apaixonado por Literatura e Paris, tornam-se amigos inseparáveis. Léon logo fica atraído por Emma que finge não saber dos sentimentos do amigo. Admira Léon, fisicamente ele (também) é tudo o que Charles não é, veste-se bem, é elegante, inteligente, bonito, ama ler, mas não acredita estar apaixonada por ele... "Amor, acreditava ela, deveria chegar com tudo ao mesmo tempo com trovões e relâmpagos (...) e mergulhar o coração inteiro num abismo... Ela não sabia que a chuva cria lagos no telhado de uma casa quando a calha está obstruída, e ela continuou segura em sua ignorância até encontrar uma rachadura na parede" (pag. 111)

Por vezes imagina como seria ter um amante, e orgulha-se disso, quer se sentir desejada por outros homens. Arruma-se e perfuma-se para encontrar Léon, ler livros pensando em discuti-los com Léon. Estão sempre juntos, quando não se encontram no restaurante, encontram-se na casa de Emma, com a desculpa de que Léon veio visitar Berthe (a filha de Emma e Charles) despertando comentários (e fofocas) dos outros moradores da cidade. Charles nunca desconfia. Léon torturava-se a planejar um modo de declarar seu amor por Emma, já não conseguindo esconder seus sentimentos e por temer não ser correspondido, Léon decide partir para Paris.

Emma já não toma conta da filha, passa seus dias reclusa em seu quarto, lendo seus livros... começando e deixando-os pela metade. Novamente passa a gastar o dinheiro da família renovando seu guarda-roupa, renovando a casa com o que vê nas revistas, na ultima moda em Paris. Sr. Lheureaux após várias tentativas, convence Emma a comprar suas mercadorias trazidas de Rouen, nunca aceita os pagamentos, sempre fiz que acertarão depois. Emma cai nas armadilhas de Lheureaux e endivida o marido.

Conhece Roldolphe Boulanger, um rico solteirão, proprietário de uma fazenda nas proximidades. Acostumado a ter qualquer mulher que desejasse, Rodolphe encantando por Emma, decide seduzí-la. Aproxima-se de Chalres, descobre o covarde e ignorante que é, e usa da "inocência" do marido para ter acesso à esposa. O que atrai Emma é o conhecimento de mundo de Rodolphe, sua vida na corte francesa, é culto, intelectual... Quando o fato é consumado, Emma se olha no espelho e vê em si uma mulher diferente. Uma mulher que trai e sente prazer com isso. O romance começa bem, são discretos, Rodolphe a trata como ela sempre desejou ser tratada até Emma estar completamente apaixonada por ele. Quando Rodolphe percebe que Emma é como todas as outras mulheres quando apaixonadas - romântica, sonhadora, boba - enjoa do romance, começa a tratá-la com indiferença e as vezes até com grosseria. Emma a princípio não nota, mas quando começa a ser evitada por Rodolphe, tenta fazer o mesmo. Dão um tempo, agem como meros conhecidos quando se encontram. Até se entregarem um ao outro novamente.

Emma gasta o dinheiro do marido comprando presentes para Rodolphe, endividando a família e assinando promissórias secretamente. Foge no meio da noite para encontrar o amante... encontram-se também no jardim da sua própria casa durante as madrugadas, com o avanço da intimidade entre os dois, Emma planeja fugir com Rodolphe, iriam para Paris, viajariam, conheceriam lugares. Marcam a data, Emma gasta outro tanto comprando o necessário para a viagem. Rodolphe, apesar de ter um sentimento por Emma, não pensa em abrir mão da sua vida de solteiro e sustentar Emma e sua filha, vai adiando o sonhado dia, viaja, desmarca, remarca, adia novamente, remarcam, e quando não mais consegue desculpas para adiar, deixa os planos correrem. Emma recebe uma carta no dia da fuga, no sótão ler as palavras de Rodolphe que não quer estragar a vida da amada, partirá sem ela e talvez um dia sentarão como amigos e rirão de tudo que viveram.

Emma cai em profunda depressão, meses na cama para desespero de Charles. O padre da cidade aproveita a oportunidade pra influenciar Emma a seguir sua religião... e tem sucesso... Emma se torna uma religiosa, comprando objetos religiosos, mudando sua postura, passa horas na igreja "rezando", as pernas doloridas de ficar em pé... a espera de uma resposta sem ter feito a pergunta.

Quando nota uma melhora, leva Emma para Rouen para distração, a conselho de Homais. No teatro, Emma reencontra Léon, no dia seguinte Charles parte e Emma fica. Léon e Emma começam um romance. Com a desculpa de ter aulas de piano, Emma viaja para Rouen toda Quinta para encontrar Léon. Mais promissórias são assinadas enquanto Emma compra presentes para o amante. A princípio Léon pagava pelo hotel mas como não tinha muitos recursos é Emma quem passa a financiar as despesas totais das visitas. Meses se passam e Emma começa a enjoar do romance, vira uma rotina mas não tem coragem de terminar o relacionamento. Charles quase descobre a farsa de Emma quando um dia encontra a suposta professora e esta diz nunca ter conhecido Emma, a esposa consegue provar o contrário ao marido. Ignorante de todos os fatos, Charles nem imagina o tamanho da dívida feita pela esposa.

Lheureaux encontra Emma e Léon em Rouen e a chantageia. Com todas as promissórias em mãos, Lheureaux contrata um advogado para, em Corte, exigir o pagamento das dívidas. Ao receber a Citação Judicial exigindo o pagamento ou teriam os bens cassados, Emma se desespera, implora a Lheureaux para cancelar a Ação, negado. Chega a se humilhar a Rodolphe, negado. Pede para Léon emprestar do chefe.

A conclusão... sem ter de onde conseguir o dinheiro para pagar Lheureaux, Emma vai a casa de Homais, o farmacêutico, toma arsênico e agoniza até a morte.

Após a morte de Emma, Charles se deixa levar pela vida... já não atende seus pacientes, perde contato com a sociedade local, vai perdendo aos poucos os pertences, a mãe já não o ajuda porque mesmo após descobrir as traições de Emma, Charles ainda a tem como perfeita. Sente-se culpado por não ter conseguido fazer Emma amá-lo. Charles morre pouco tempo depois, a filha (Berthe) é enviada para os cuidados da avó, que também morre algum tempo depois... como o avó (pai de Emma) está velho e paralítico, Berthe foi enviada para os cuidados de uma tia pobre, que enviou a menina para trabalhar numa fazenda de algodão para sobreviver.

Eu não simpatizei com Emma desde o início: imatura, sonhadora, inocente (no início) e inexperiente, almejando um mundo de ilusões inatigíveis, sem conseguir separar realidade e ficção, deseja o romance dos livros e acredita ser possível, busca (o que não é ruim). Com o passar do tempo vira uma pessoa dissimulada, incontrolável, não sabendo lidar com seus sentimentos nem o dos outros... o fato de ela gostar de Literatura não me fez mudar de idéia, piorou quando se percebe que ela usa a os livros pra fugir da sua realidade e aceitar como verdade, no caso de Emma, os livros são vistos como influência negativa e de certa forma prejudiciais a sua daúde.

Não posso deixar de citar seu comentário sobre o prazer de ler, e creio que jamais alguém o explicou de melhor forma: "Sem deixar seu assento você passeia por paisagens imaginárias, e seus pensamentos se misturam com a história, prolongando-se por detalhes ou saltando adiante com a trama. Sua imaginação se confunde com os personagens, e parece que eles são parte do seu próprio coração, batendo dentro de suas roupas." (pag. 97)

No fim, Emma decide buscar o mesmo destino de Anna Karenina (Tolstoy) e Edna Pontellier (Chopin)... é de se esperar que uma mulher insegura, egoísta e covarde busque tal destino, Emma não sabe enfrentar a realidade. Podendo escolher dizer a verdade, confessar a Charles suas falhas e receber seu perdão, e ambos buscar uma solução para o problema... Emma deixa claro que jamais faria diferente. Emma tinha certeza que Charles a perdoaria e é exatamente isso o que não suporta. O fato de Charles não ter iniciativa, de ser covarde e aceitar sua vida medíocre e simples. Emma odeia Charles por não desejar ter mais ou ser mais, fato piorado pela terrível experiência da cirúrgia do pobre Hipólito, que no fim teve de ter a perna amputada. Até aquele ponto, Emma ainda tentou buscar um motivo para "gostar" do marido, após o incidente, o marido é visto como um nada.

Alguns estudiosos dizem que os personagens em Madame Bovary foram baseados em pessoas reais, Gustave Flaubert realmente teria viajado por todos os lugares mencionados e experienciado alguns dos momentos, e investigado fatos de terceiros para tê-los no livro.

Flaubert é bastante descritivo, os cenários são minuciosamente datalhados, o leitor se sente na história. Sente-se pena por alguns, indignação por outros, é uma confusão de sentimentos que faz da obra uma delícia de ler. As vezes se torna cansativo porque o livro é longo e Flaubert realmente encheu as páginas com detalhes, levei quase 1 mês lendo mas vale a pena!

* Livro da Lista Rory Gilmore.

3 comments:

Juliana said...

EU adorei madame Bovary, estudei o livro na facul..E uma trama muito boa e realmente Flauber e bem detalhista...Adoro esse livro!


to paradinha no meu blog, pq nao enconto nenhum livro legal, mas sempre passo por aqui para visitar


bjs...

Juliana said...

So pq eu tinha dito que nao tinha postado mais nada, rponto tem poste novo no meu blog



bhs juh!

Andréia M. G. said...

Eu ainda vou ler "Madame Bovary". Sempre tive curiosidade por ter servido de "inspiração" a Eça de Queirós para "O primo Basílio", este que li e adorei. :-)